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sábado, 28 de novembro de 2015

1.º Domingo do Advento - O “princípio e fundamento” de nossa existência

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 
21, 25-28.34-36)
Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: "Haverá sinais no sol, na lua e nas estrelas. Na terra, as nações ficarão angustiadas, com pavor do barulho do mar e das ondas. Os homens vão desmaiar de medo, só em pensar no que vai acontecer ao mundo, porque as forças do céu serão abaladas.

Então eles verão o Filho do Homem, vindo numa nuvem com grande poder e glória. Quando estas coisas começarem a acontecer, levantai-vos e erguei a cabeça, porque a vossa libertação está próxima.

Tomai cuidado para que vossos corações não fiquem insensíveis por causa da gula, da embriaguez e das preocupações da vida, e esse dia não caia de repente sobre vós; pois esse dia cairá como uma armadilha sobre todos os habitantes de toda a terra.

Portanto, ficai atentos e orai a todo momento, a fim de terdes força para escapar de tudo o que deve acontecer e para ficardes em pé diante do Filho do Homem".
*
O Evangelho deste domingo tem duas partes: a primeira (v. 25-28) fala do abalo deste mundo que passa; a segunda (v. 34-36), de como os homens devem preparar-se para a vinda de Cristo, não só no fim dos tempos, mas também no dia a dia.
No que pode ser considerado o núcleo do ensinamento dessa liturgia, Nosso Senhor adverte os Seus discípulos: "Tomai cuidado para que vossos corações não fiquem insensíveis (1) por causa da gula, da embriaguez (2) e das preocupações da vida" (v. 34).
A expressão grega βαρηθῶσιν, aqui traduzida como "insensíveis", está ligada mais propriamente à noção de peso, gravidade. Traz a ideia de um coração apegado à baixeza deste mundo terreno, inclinado às coisas desta vida – das quais, nessa passagem, Cristo cita duas, constituindo como que "dois estágios" de conversão: a primeira diz respeito aos prazeres da carne (κραιπάλῃ, no original); asegunda, às preocupações desta vida (μερίμναις βιωτικαῖς, no grego).
A "primeira conversão", por assim dizer, consiste em livrar-se dos pecados ligados aos sentidos. Qualquer pessoa íntegra e com o mínimo de virtudes humanas é capaz de perceber o mal em que se afundam as pessoas dependentes do álcool, viciadas em drogas ou obstinadas por sexo. Os seus maus hábitos as conduzem a uma condição pior que a dos próprios animais: estes, de fato, sendo só carne, estão satisfeitos vivendo de comer, beber e ter sexo; o ser humano, ao contrário, nunca se contenta simplesmente com prazeres carnais, porque a sua alma imortal tem sede de uma felicidadeque só Deus pode preencher.
O primeiro passo de quem quer converter-se, portanto, é viver a virtude da temperança. Para isso serve a prática do jejum, vivamente recomendada neste tempo do Advento que se inicia.
Há, todavia, uma "segunda conversão", que consiste em ordenar os nossos esforços para o fim adequado. Não basta deixar as drogas, a bebida ou a prostituição, se não se entende a razão pela qual se deixa tudo isso. Não basta comportar-se bem, se se perde de vista a meta por que trabalhar. Ninguém se engane: a primeira etapa da conversão é muito importante, deixar os pecados mortais é essencial, mas não se pode ficar estacionado nisso, sob pena de que a moral cristã se transforme em um mero "moralismo" ou "código de etiqueta".
A analogia de Marta e Maria, contida no Evangelho de S. Lucas (10, 38-42), ajuda a ilustrar bem que são as "preocupações desta vida", de que devemos nos desprender. Ao cuidar da cozinha e dos afazeres da casa, Marta não está fazendo nada de ilícito, muito pelo contrário. Sua agitação, no entanto, denuncia a desordem em que se encontra a sua alma: mesmo fazendo coisas boas, ela acabou menosprezando "a melhor parte"; desligada da virtude da prudência, que ordena todas as coisas para o seu devido fim, a sua atitude tornou-se motivo de repreensão.
Daí a importância de fixar a meta, o "princípio e fundamento" de toda a nossa existência. O grande Santo Inácio de Loyola os definia assim:
"El hombre es criado para alabar, hacer reverencia y servir a Dios nuestro Señor y, mediante esto, salvar su ánima; y las otras cosas sobre la haz de la tierra son criadas para el hombre, y para que le ayuden en la prosecución del fin para que es criado. De donde se sigue, que el hombre tanto ha de usar dellas, quanto le ayudan para su fin, y tanto debe quitarse dellas, quanto para ello le impiden. – O homem é criado para louvar, prestar reverência e servir a Deus nosso Senhor e, mediante isto, salvar a sua alma; e as outras coisas sobre a face da terra são criadas para o homem, para que o ajudem a conseguir o fim para que é criado. Donde se segue que o homem tanto há de usar delas quanto o ajudam para o seu fim, e tanto deve deixar-se delas, quanto disso o impedem." [1]
Que este tempo do Advento nos ajude em nossa "segunda conversão", a fim de que ordenemos todos os atos da nossa vida para o louvor, a reverência, o serviço de Deus e a salvação da nossa alma.
fonte: www.padrepauloricardo.org

Referências

  1. Exercícios Espirituais, n. 23.

quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Quinta-feira da 34.ª Semana Comum (I) - A destruição do Templo

Versão áudio

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc
 21, 20-28)
Naquele tempo, Jesus disse aos discípulos: "Quando virdes Jerusalém cercada de exércitos, ficai sabendo que a sua destruição está próxima. Então, os que estiverem na Judéia fujam para as montanhas; os que estiverem na cidade afastem-se dela, e os que estiverem fora da cidade, nela nem entrem. Pois esses dias são de vingança, para que se cumpra tudo o que dizem as Escrituras.

Ai das mulheres grávidas e daquelas que estiverem amamentando naqueles dias, pois haverá grande angústia na terra e ira contra este povo. Serão abatidos pela espada e levados presos para todas as nações. E Jerusalém será pisada pelos pagãos, até que se complete o tempo marcado para eles. Haverá sinais no sol, na lua e nas estrelas. Na terra, as nações ficarão angustiadas. apavoradas com o bramido do mar e das ondas. As pessoas vão desmaiar de medo, só em pensar no que vai acontecer ao mundo, porque as potências celestes serão abaladas. Então, verão o Filho do Homem, vindo numa nuvem, com grande poder e glória. Quando estas coisas começarem a acontecer, levantai-vos e erguei a cabeça, porque a vossa libertação está próxima."
O Evangelho de hoje se refere às duas grande balizas que demarcam o Fim dos Tempos: de um lado, a destruição de Jerusalém, levada a cabo no ano 70 d.C.; de outro, a segunda vinda de Nosso Senhor. Esses dois eventos delimitam, com efeito, o tempo da Economia Sacramental, quer dizer, estes últimos dias (cf. Hb 1, 2) em que vivemos: o tempo próprio da Igreja. Ora, conquanto digam respeito, em sentido estrito, à macro-história da humanidade, quer dizer, aos dois principais momentos que indicam nossos últimos e derradeiros dias, esses dois eventos podem interpretar-se também sob uma perspectiva mística. De fato, muitos Santos Padres vêem na destruição de Jerusalém a destruição, pelo pecado, da alma humana. Pois do mesmo modo como o Templo sagrado dos judeus fora pisado pelos pegão, assim também o homem pode ser profanado por aquela "abominação da desolação" de que fala Cristo (cf. Mt 24, 15; Mc 13, 14; Dn 9, 27): a alma, deixando-se vencer pelas tentações que a sediam, torna-se "templo" do pecado, "templo" de ídolos e de iniquidade.
Acontece então o abalo cósmico a que alude o Evangelho: "Haverá sinais no sol, na lua e nas estrelas", ou seja: o brilho dos santos vai, ao longo dos séculos, esmorecendo; as almas, renascidas pelo Batismo, renunciam à vocação a se tornarem luz do mundo e sal da terra; os fiéis, enfim, deixam que em seus corações se instale a "desolação": abominam a Deus para adorar a Júpiter. Vêm, em seguida, os "dias de vingança": o Senhor nos visita com tribulações e sofrimentos, a fim de despertarmos do sono do pecado. A justiça divina há-de manifestar-se, porque Deus nos ama e deseja a nossa salvação. Ele nos chama e chamará sempre a tomar parte na dor que, aliás, não poupara nem mesmo ao Seu Filho muito amado. O advento de Cristo sobre as nuvens do céu, por fim, representa a vinda do Senhor através da Igreja: a nuvem simboliza o Seu Corpo Místico que, como tal, nos traz de volta a graça que, por culpa nossa, perdêramos.

O Evangelho de hoje, visto sob a ótica seja da história humana, seja de nossa própria alma, nos chama a reconhecer sacralidade do nosso espírito. Somos, pois, esse templo santo em que Deus e habita e do qual não O devemos expulsar. Perseveremos em nossa fidelidade à única e verdadeira divindade; que Ele nos dê a graça de rejeitarmos a desolação do pecado, a abominação da idolatria e, iluminado-a com a Sua graça, mantenha sempre luminosa a nossa pobre e frágil alma, santuário predileto do Altíssimo.

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Como rezar o Rosário da maneira certa? São Luis de Montfort explica!


É necessária a pureza da Intenção

Não é tanto a duração de uma oração, mas o fervor com a qual é rezada que agrada a DEUS Todo-Poderoso e toca seu Coração.

Mais vale uma única Ave Maria rezada com devoção e fé, que cento e cinquenta rezadas distraidamente.

A maioria dos católicos reza o Rosário, todos os quinze mistérios ou um Terço, ou ao menos, algumas dezenas. Então, porque será que tão poucos, abandonam seus pecados e progridem na vida espiritual?

Com certeza deve ser porque não rezam como se deve! É necessário pensar bem em como se deve orar, se realmente queremos agradar a DEUS e nos tornarmos santos.

Para que se reze o Rosário com fruto é necessário estar em estado de graça ou ao menos que se esteja completamente determinado a abandonar o pecado mortal.

Isto nós sabemos por que os teólogos nos ensinam que as boas obras e as orações são obras mortas, caso sejam feitas em estado de pecado mortal.

Elas não são agradáveis a DEUS, nem podem nos ajudar a ganhar a vida eterna. É por isto que o livro do eclesiástico diz: “O louvor não tem beleza na boca do pecador”(15,9). Louvores a DEUS, a Ave Maria e o PAI Nosso não são do agrado de DEUS, se forem rezadas por pecadores não arrependidos. 

Nosso SENHOR disse: “Este povo honra-me com os lábios, mas o seu coração está longe de mim.” (Mc 7,6) É como se Ele estivesse dizendo: 
“Aqueles que se inscrevem na Minha Confraria e rezam o Rosário todo dia (até mesmo as quinze dezenas), mas sem se arrependerem de seus pecados, Me honram com os lábios apenas, mais seus corações estão longe de Mim.” 

Eu disse que para rezar o Rosário, com proveito, devemos estar em estado de graça “ou pelo menos com firme resolução de deixar de cometer pecados, principalmente os pecados mortais” em primeiro lugar, porque é certo que DEUS só houve as orações dos que estão em estado de graça e seguir-se ia então que as pessoas em estado de pecado mortal não deveriam rezar.

Este ensino é errôneo e é condenado pela santa Mãe Igreja, porque é certo que os pecadores necessitam muito mais rezar que as pessoas justas. Seria uma doutrina horrível, pois é verdade que seria fútil e inútil dizer ao pecador para rezar por inteiro, ou mesmo em parte o seu Rosário porque isto nunca o ajudaria.

Em segundo lugar, porque se eles, os pecadores ingressassem em uma confraria e rezarem o Rosário ou outra, mas não tendo a clara intenção de abandonar o pecado, eles fazem parte dos falsos devotos.

Estes devotos impenitentes, escondidos sob um manto, usando um escapulário e com o Rosário na mão gritam: “Ave Maria, boa Mãe, Santa Maria!…”
E ao mesmo tempo, por seus pecados, eles crucificam Nosso Senhor JESUS CRISTO dilacerando sua carne outra vez.

É uma grande tragédia, pois mesmo dentro das santíssimas Confrarias de Nossa Senhora, almas se precipitaram no fogo do Inferno. 

Nós sinceramente aconselhamos a todos a rezar o Santíssimo Rosário:
- aos justos, a fim de que perseverem e cresçam na graça de DEUS;
- aos pecadores, para que saiam dos seus pecados.

Mas não agrada, nem pode agradar a DEUS, que exortemos a um pecador que faça manto protetor da Santíssima Virgem um manto de condenação para ocultar seus crimes aos olhos públicos.

O Rosário, que é a cura para todos os nossos males, seria trocado por um veneno mortal e funesto. “A corrupção do melhor se torna o pior!” 

O sábio Cardeal Hugo afirma: “É necessário ser puro como um Anjo para se aproximar da Santíssima Virgem e rezar a Saudação Angélica.” 

Um dia, Nossa Senhora apareceu a um homem imoral dentro de um cesto cheio de frutos, mas o próprio cesto estava cheios de imundícies. O homem teve horror do que vira, e Nossa
Senhora disse: 

“Tu me serves assim! Apresentas-me belíssimas rosas num cesto imundo. Julgas tu mesmo que posso aceitar presentes desta espécie?”
*  *  *
Retirado de: 44º Capitulo – Extraído do Livro “O Segredo do Rosário” São Luiz M. Grignion de Montfort.

Santo Rosário, consolação na hora do Juízo

Evite cuidadosamente fazer o que certa piedosa mas voluntariosa senhora de Roma fez.

 
Era uma pessoa tão piedosa e fervorosa que com sua vida santa confundiu os religiosos austeros da Igreja de DEUS.

 
Ao pedir a São Domingos que lhe aconselhasse sobre sua vida espiritual ela pediu-lhe que a ouvisse em confissão. Por penitência, ele lhe mandou que rezasse um Rosário completo e aconselhou-a que o rezasse diariamente. Ela disse que não tinha tempo para rezá-lo, desculpando-se e dizendo que tinha que fazer as Estações de Roma (1) todo dia, que vestia roupas de sacas, camisas de cilício, que tomava disciplina sobre si várias vezes por semana, que tinha tantas outras penitências e que jejuava bastante. São Domingos aconselho-a novamente e várias outras vezes a seguir seu conselho e rezar o Rosário, mas ela continuava a recusar. Ela saiu do confessionário, horrorizada pela tática de seu novo diretor espiritual, que arduamente lhe persuadia a seguir a devoção que não era de seu agrado.
 

 
Mais tarde, quando ela estava orando, caiu em êxtase, e viu sua alma se apresentando diante do Trono do Julgamento de NOSSO SENHOR. São Miguel pôs todas as suas penitências e outras orações em dos pratos da balança e todos os seus pecados e imperfeições no outro. O prato das boas obras ficou grandemente suspenso sem conseguir equilibrar ao outro dos pecados e imperfeições.

Cheia de espanto ela clamou por misericórdia, implorando o auxílio da Santíssima Virgem, sua graciosa advogada, que pegou o único Rosário que ela tinha rezado por aquela penitência e o pôs no prato das boas obras. Só este único Rosário era tão pesado que pesava mais que todos seus pecados e também suas boas obras. Nossa Senhora, então, repreendeu-a por não ter seguido o conselho de seu servo Domingos e por não ter rezado o Rosário diariamente.

Logo que voltou a si, correu e se pôs aos pés de São Domingos e lhe disse o que acontecera, implorou seu perdão por não ter acreditado e prometeu rezar o Rosário fielmente todos os dias. Por este meio ela se elevou à perfeição cristã e finalmente à glória da vida eterna.

Vocês que são pessoas de oração, aprendam disto quão grandioso é o poder, o valor e a importância desta devoção do Santíssimo Rosário quando o mesmo é rezado e unido à meditação sobre os Mistérios.

Poucos santos alcançaram as mesmas alturas em oração que Santa Maria Madalena, que era transportada diariamente aos Céus pelos Anjos, e que teve o privilégio de aprender aos pés do próprio JESUS CRISTO e de Sua Santíssima Mãe. Contudo, um dia quando perguntou a DEUS que lhe mostrasse uma maneira certa de como progredir em Seu amor e como chegar à mais alta perfeição, Ele enviou São Miguel Arcanjo para dizer-lhe em Seu lugar, que não havia outra maneira para se alcançar a perfeição do que a meditação na Paixão de Nosso SENHOR. São Miguel então colocou, na entrada de sua caverna, uma cruz e lhe disse que rezasse diante dela, contemplando os Mistérios Dolorosos que ela presenciara com seus próprios olhos.

Que o exemplo de São Francisco de Sales, o grande diretor espiritual de seu tempo, o estimule a unir-se à santa Confraria do Rosário, já que foi um grande santo, fez votos de rezar o Rosário completo todos os dias de sua vida.

São Carlos Borromeo também rezou todos os dias e com insistência, recomendava a devoção aos pregadores, aos eclesiásticos, nas conferências e a todo o povo.

São Pio V, um dos Papas mais eminentes da Igreja, rezava diariamente o Rosário. São Tomás de Villa Nova, Arcebispo de Valência, Santo Inácio, São Francisco Xavier, São Francisco de Borja, Santa Teresa e São Felipe Neri, bem como muitos outros grandes homens que não pude aqui mencionar foram grandes devotos do Santo Rosário.

Segui seus exemplos! Seus diretores espirituais estarão satisfeitos e se ficarem sabendo dos frutos que se ganha desta devoção, eles serão os primeiros a lhe animar a adotá-la.

O Segredo do Rosário - São Luis Maria Grignon de Monfort.

fonte: http://osegredodorosario.blogspot.com.br/

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

O Calvário e a Missa - 4ª Parte: Consagração


Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?
(São Mateus 27,46)

Eis a quarta palavra da Consagração da Missa do Calvário. As três primeiras palavras foram dirigidas aos homens. A quarta, porém, foi dirigida a Deus. Estamos agora na última fase do drama da Paixão. Na quarta Palavra, e em todo o Universo, só existem apenas Deus e Jesus. Esta é a hora das trevas.

Subitamente, o silêncio dessa escuridão é quebrado por um grito – tão terrível e tão inesquecível que até aqueles que não compreenderam a língua em que foi expresso hão de recordar-se sempre do tom estranho em que foi proferido: “Eli, Eli, lamma Sabcthany”.

Sim, embora alguns não pudessem compreender essas palavras da língua hebraica, o tom em que foram ditas não mais lhes esqueceu em toda a sua vida.

As trevas que cobriam a terra naquele momento representam apenas o símbolo exterior da noite escura da alma. O sol pode esconder a sua face perante o terrível crime dos deicidas, mas a verdadeira razão da noite que se estendeu sobre a terra foi a sombra da Cruz que se erguia no Calvário.

Toda a criação ficou imersa nas trevas da dor.

Qual foi, todavia, a razão do grito que partiu da escuridão?
 “Meu Deus, Meu Deus, por que Me abandonastes?”

Esse foi o grito de espanto para o pecado, em que o homem abandonou Deus, em que a criatura esquece o Criador, em que a flor despreza o sol que lhe deu força e beleza. O pecado é uma separação, um divórcio da união com Deus, e do qual derivam todos os divórcios. Desde que Jesus veio à terra para remir os homens dos seus pecados, é certo que Ele sabia que havia de sentir esse abandono, esse apartamento, esse divórcio.

Ele sentiu-o, antes de mais, no íntimo da Sua alma, tal como a base da montanha, se fosse consciente, sentiria o abandono do sol quando uma nuvem descesse sobre ela, embora os seus cumes se conservassem radiosos, banhados de luz.

Não havia sombra de pecado na alma de Jesus, embora Ele quisesse sentir os efeitos do pecado, e a terrível sensação de isolamento e solidão – a solidão do afastamento de Deus.

Renunciando à divina consolação que poderia pertencer-Lhe, Ele quis mergulhar na tremenda solidão da alma que se extraviou de Deus pelo pecado, para expiar a solidão do ateu que nega a existência de Deus e deposita a sua fé nas coisas terrenas, a dor do coração despedaçado de todos os pecadores que sentem a amargura da ausência do seu Criador.

Jesus foi até ao ponto de remir todos aqueles que não crêem e que, na tristeza e na miséria, exclamam, blasfemando: “Por que é que a morte levou tal pessoa?”, “Por que é que perdi aos meus bens?”; “Porque é que hei de sofrer”.

O “Porquê” que Jesus dirigiu a Seu Pai é uma expiação que abrange os “porquês” soltados por aqueles que blasfemam.

Para melhor revelar a sensação de tal abandono, Jesus exteriorizou-o. Porque o homem se apartara de Deus, Ele permitiu que o Seu sangue se separasse do Seu Corpo. O pecado entrara no sangue do homem e, como se os pecados do mundo recaíssem sobre Ele, Jesus deixou derramar o Seu precioso sangue, do cálice do Seu Corpo. Quase que podemos ouvi-Lo dizer:

“Pai, este é o Meu Corpo, este é o Meu Sangue. Eles estão separados um do outro, tal como a humanidade se separou de Ti. Esta é a Consagração da Minha Cruz”.

O que aconteceu então no Calvário acontece agora na Missa. Com uma diferença: Na Cruz, o Salvador estava só e, na Missa, está conosco. Nosso Senhor, agora, está no céu, à mão direita de Seu Pai, intercedendo por nós. Já não pode, portanto, sofrer na Sua natureza humana.

Como pode, pois, a Missa ser a renovação do drama da Cruz? Como é que Cristo pode renovar o drama da Cruz?

Ele não pode, realmente, voltar a padecer na Sua natureza, porque está no céu, gozando a divina bem-aventurança, mas pode ainda sofrer nas nossas naturezas humanas.

Ele não pode, de fato, reviver o Calvário no Seu Corpo físico, mas pode renovar os Seus sofrimentos no Seu Corpo Místico que é a Igreja.

O sacrifício da Cruz pode ser renovado, contanto que nós Lhe façamos a oferta do nosso corpo e do nosso sangue, em toda a plenitude. Jesus pode também oferecer-Se novamente a Seu Pai Celestial, pela redenção do Seu Corpo Místico – a Igreja.

Cristo anda no mundo juntando as almas que desejam ser outras tantos Cristos. Para que nos nossos sacrifícios, as nossas tristezas, os nossos calvários, as nossas crucificações, não fiquem isoladas, desunidas, a Igreja reúne-os, junta-os, e o agrupamento, a massa de todos esses sacrifícios humanos reúne-se ao grande sacrifício de Cristo na Cruz, durante a Missa.

Quando assistimos ao Santo Sacrifício da Missa, não somos precisamente apenas criaturas terrenas, nem indivíduos solitários, mas sim parcelas vivas de uma grande ordem espiritual, na qual o Infinito penetra e envolve o finito, e o Eterno penetra no ser temporário e passageiro, e o Espiritual reveste a materialidade.

À face de Deus nada existe sobre a terra de mais solene e que mais respeito infunda do que o momento da Consagração, pois a Missa não é uma oração, nem um hino. – é um Ato Divino com o qual entramos em contato num dado momento do tempo.

A rádio pode oferecer-nos uma ilustração imperfeita, um esboço vago do que acabamos de exprimir. A Missa é um Ato único, divino, singular, com o qual entramos em contato todas as vezes que ela se celebra.

Quando a face da medalha ou da moeda são gravadas, ou cunhadas, qualquer desses objetos é a representação visível de uma idéia espiritual que existiu no espírito do artista. Do original podem fazer-se reproduções inúmeras, desde que em cada peça de metal se grave ou reproduza o original.

Na missa dá-se um fato semelhante. O modelo ou padrão é o Sacrifício de Cristo no Calvário, renovado nas almas que entraram em contato com Ele, no momento da Consagração. A respeito, porém, da multiplicidade da Missa, o Sacrifício é apenas um, e sempre o mesmo. A Missa é a comunicação do Sacrifício do Calvário, sob as espécies de pão e de vinho.

Também nós estamos no altar sob essas aparências, pois ambas representam o alimento da vida. Oferecendo, pois, aquilo que nos dá vida, oferecemo-nos, simbolicamente a nós próprios. Além disso, para se transformar em pão, o grão tem de ser moído, e as uvas têm de ser esmagadas, para se transformarem em vinho e, assim, representam os Cristãos, que são chamados a sofrer com Cristo, para que um dia possam também alcançar o Reino dos céus.

O momento da consagração da Missa que nos aproxima de Nosso Senhor equivale às palavras que Jesus pronunciou: “Tu Maria, vós, João, Pedro e André, dai-Me o vosso corpo, dai-Me o vosso sangue, dai-Me todo o vosso ser. Eu não posso sofrer mais. Passei por todos os padecimentos da Cruz, esgotei todos os sofrimentos que o Meu Corpo físico podia suportar, mas não preenchi a medida dos tormentos necessários ao Meu Corpo Místico, do qual vós fazeis parte. A Missa é o momento em que cada um de vós pode escutar literalmente a minha exortação: ‘Toma a tua cruz e segue-Me’”.

Do alto da Cruz, Nosso Senhor já olhava para todos aqueles que haviam de vir, para todos nós, esperando que algum dia nos entregássemos a Ele no momento da consagração. Assistindo à Santa Missa, realizamos, portanto, a esperança que antecipadamente Jesus pôs em nós.

Quando chega o momento da consagração, em obediência às palavras de Deus Nosso Senhor, “Fazei isto em memória de Mim”, o sacerdote toma o pão e diz: “Este é o Meu corpo”; depois, sobre o cálice que contém o vinho, acrescenta: “Este é o Meu sangue do novo e eterno Testamento”. A consagração do pão e do vinho é feita separadamente, como representação da separação do corpo e do sangue; tal como sucedeu na crucificação, o drama do Calvário repete-se sobre o altar.

Cristo não está, porém, sozinho no nosso altar, pois nós estamos com Ele. Daí o duplo sentido da palavra da consagração que, em primeiro lugar, significam: “Este é o Corpo de Cristo; este é o Sangue de Cristo”. O segundo significado é: “Este é o meu corpo, este é o meu sangue”.

E é esta a finalidade da vida! Reunirmo-nos em união com Cristo, aplicar os Seus méritos às nossas almas, imitando-O em todas as coisas, e até na Sua própria morte sobre a Cruz.

A consagração que Jesus fez no Calvário é repetida por cada um de nós quando assistimos à Santa Missa.

Não existe algo de mais trágico no mundo do que a dor sofrida em vão. Quanto sofrimento existe nos hospitais, entre os pobres e os abandonados, e quantos desses sofrimentos são perdidos! E porquê?
Porque muitas almas, abandonadas, crucificadas, não dizem, unidas a Nosso Senhor, no momento da consagração: “Este é o meu corpo. Tomai-O”.

Nenhum padecimento seria desperdiçado, vão, se todos aqueles que sofrem, dissessem nesses momentos:

“Meu Deus, entrego-me nas Vossas mãos. Toma o meu corpo, o meu sangue, a minha alma, a minha vontade, a minha energia, a minha força, os meus bens, a minha saúde. Toma tudo o que eu sou e possuo, pois eu me consagro inteiramente a Vós e em união conVosco, para que o Pai Celestial veja nessa dádiva o Vosso bem-amado Filho.

Àquele em quem Ele pôs todas as Suas complacências. Transmuda o pobre pão da minha vida na Vossa vida divina; transforma o vinho da minha vida desperdiçada no Vosso divino espírito; une o meu coração despedaçado ao Vosso coração; transforma a minha cruz num crucifixo.


Não deixes que a minha dor e o meu abandono se percam, junta os seus fragmentos e, tal como a gota de água é incorporada no vinho, durante o ofertório da missa, deixa que a minha vida se incorpore na Vossa.

Deixa que a minha pequena cruz se reúna à Vossa grande Cruz, para que eu possa obter as alegrias da felicidade eterna, em união conVosco!

Consagra as provações da minha existência, pois elas não serão compensadas, senão por meio da minha união conVosco. Transubstancia-me, tal como o pão que é agora o Vosso corpo, e o vinho que é agora o Vosso sangue, e eu serei inteiramente Vosso.

Não me importa que as aparências permaneçam, tal como sucede ao pão e ao vinho, e que aos olhos da terra eu pareça o mesmo que era antes. A minha permanência no mundo, os meus deveres habituais, o meu trabalho, a minha família – tudo isso representa as espécies da minha vida que continuam inalteradas.

A substância da minha vida, porém, a sua essência, - a minha alma, a minha vontade, o meu espírito, o meu coração – transubstancia-os, transforma-os inteiramente no Vosso serviço, para que todo o meu ser possa saber e sentir toda a doçura do amor de Cristo”. Amém.

(O Calvário e a Missa – Arcebispo Fulton J.Sheen: Consagração)

fonte: http://a-grande-guerra.blogspot.com.br/

Segunda-feira da 34.ª Semana Comum (I) - A oferta da viúva

Versão áudio

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc
 21, 1-4)
Naquele tempo, ao levantar os olhos, Jesus viu pessoas ricas depositando ofertas no cofre. Viu também uma viúva necessitada que deu duas moedinhas. E ele comentou: "Em verdade, vos digo: esta viúva pobre deu mais do que todos os outros. Pois todos eles depositaram como oferta parte do que tinham de sobra, mas ela, da sua pobreza, ofereceu tudo que tinha para viver."
Tendo enfim chegado a Jerusalém, Jesus vive a partir de agora os Seus últimos momentos antes da Paixão. O Senhor está no Templo, escreve São Lucas, e assiste às ofertas que por lá se faziam. Ricos e abastados depositam no cofre somas vultosas daquilo que lhes resta; entregam, pois, apenas os restolhos das riquezas que o próprio Senhor, em Sua imensa generosidade, lhes dera. Eis que uma viúva, discreta e silenciosa, dirige-se ao gazofilácio e deixa ali duas moedinhas: ela, "da sua pobreza", ofereceu a Deus "tudo o que tinha para viver." O episódio desta pobre viúva como que recapitula o drama básico que a humanidade vive desde as suas origens.
Esta cena, com efeito, pode ser contemplada já em Caim e Abel: aquele oferecera em oblação os frutos da terra; este, no entanto, devolveu ao Senhor os primogênitos dos seus rebanhos (cf. Gn 4, 3-4). Abel de bom gradou consagrou a Deus o que de melhor conseguira produzir; mas Caim, de seu lado, endureceu-se, recusou oferecer ao Senhor as primícias da sua colheita. O primeiro tornou-se justo: é em Abel que, de certo modo, nasce a Igreja, a Igreja dos que, por fidelidade a Deus, derramam por Ele seu sangue inocente. Caim, ao contrário, é o primeiro dos réprobos, dos que, por não quererem entregar-Se a Deus, acabam por desviar-se d'Ele: "E tu serás peregrino e errante sobre a terra" (Gn 4, 12).
O Evangelho de hoje nos coloca, assim, diante duma escolha: seguir a Igreja de Abel, que, com o coração aberto, entrega tudo a Deus, ou a "igreja" de Caim, que "se retirou da presença do Senhor" (Gn 4, 16). Cristo, porém, já Se adianta e nos exorta a fazer nossa a gratidão daquela viuvinha. Pois tudo quanto temos e possuímos d'Ele mesmo o recebemos; por isso, quando Lhe entregamos tudo, nada perdemos; antes ganhamos, porque restituímos ao Sumo Bem todos os dons que Ele a toda hora nos comunica. Ofereçam-nos, pois, inteiramente à Fonte de todo bem; façamos de nossa vidas uma oblação agradável aos Seus olhos; entreguemo-nos com aquela generosa disposição da viúva: dar tudo o que temos para viver nesta vida, a fim de que possamos, esquecendo-nos de nós mesmos, nascer para a vida que nunca acaba.

sábado, 21 de novembro de 2015

Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo - Como fazer Cristo reinar em nossos corações?

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João
(Jo
 18, 33-37)
Naquele tempo, Pilatos chamou Jesus e perguntou-lhe: "Tu és o rei dos judeus?" Jesus respondeu: "Estás dizendo isto por ti mesmo ou outros te disseram isto de mim?"

Pilatos falou: "Por acaso sou judeu? O teu povo e os sumos sacerdotes te entregaram a mim. Que fizeste?"

Jesus respondeu: "O meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, os meus guardas lutariam para que eu não fosse entregue aos judeus. Mas o meu reino não é daqui".

Pilatos disse a Jesus: "Então tu és rei?"

Jesus respondeu: "Tu o dizes: eu sou rei. Eu nasci e vim ao mundo para isto: para dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz".
*
Jesus veio ao mundo para implantar o Reino de Deus. Foi o que prenunciou São João Batista, ao pregar um batismo de conversão, profetizando estar próximo o Reino de Deus (cf. Mt 3, 2); e o anjo Gabriel, anunciando a Maria que seu Filho se sentaria no trono de Davi (cf. Lc 1, 32). Foi também o que indicou Nosso Senhor, ao revelar por meio de parábolas em que consiste esse Reino; ao ser condenado na Cruz como Rei (cf. Jo 19, 19); e ao revelar abertamente – como está no Evangelho deste domingo – não ser o Seu Reino deste mundo.
Esse último dado, na verdade, é o que explica a aparente discrepância entre as profecias a Seu respeito e o modo como elas se cumprem. Jesus vem verdadeiramente trazer o Reino de Deus e sentar-se no trono de Davi. O modo como se acabam os Seus dias, no entanto, parecem apontar para uma farsa: o enviado de Deus termina revestido de um manto de burla, coroado de espinhos e portando um cetro de cana. Como isso é possível?
A resposta vem da boca do próprio Cristo, quando Ele diz: "Regnum meum non est de mundo hoc – O meu reino não é deste mundo" (v. 36).
Em que consiste esse reino, então? A resposta é dada por Orígenes, um Padre da Igreja, para quem há pelos menos duas acepções desse reino a serem consideradas [1].
A primeira, cristológica, explica o Reino de Deus como sendo o próprio Jesus – "αύτοδασιλεία" (autobasileia), diz Orígenes [2]. Alguns teólogos liberais da passagem do século XIX para XX (Adolf von Harnack, sobretudo) alegam que a Igreja teria traído a mensagem de Cristo. Este teria vindo anunciar o Reino de Deus, e a Igreja, ao contrário, prega a pessoa de Jesus. A verdade, porém – evidente a qualquer um que entre em contato com os Evangelhos –, é que é Jesus quem se apresenta como objeto de fé a todo momento. "Tu crês no Filho do Homem?", Ele pergunta ao cego de nascença. "Quem é, Senhor, para que eu creia nele?" "Tu o estás vendo; é aquele que está falando contigo", responde Jesus (Jo 9, 35-38). Antes de Sua paixão, ele acalma os Apóstolos: "Não se perturbe o vosso coração! Credes em Deus, crede também em mim" (Jo 14, 1). Passagens semelhantes a essas se repetem várias vezes. Pelo mistério da união hipostática de Cristo, da humanidade unida à Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, o Reino de Deus verdadeiramente desce dos céus e faz a sua morada entre os homens.
Disso decorre a segunda dimensão do reino, eminentemente mística, que fala da soberania de Deus sobre os corações humanos:
"Quem reza pela chegada do Reino de Deus, reza sem dúvida pelo Reino de Deus que ele já leva em si mesmo, e pede para que este Reino produza frutos e para que chegue à sua plenitude. Pois em cada homem santo, Deus domina (= é soberania, Reino de Deus)... Por isso, se quisermos que Deus domine em nós (que o seu Reino esteja em nós), então o pecado não pode de modo nenhum dominar no nosso corpo mortal (Rm 6, 12)... Então Deus deve passear em nós como num paraíso espiritual (Gn 3, 8) e somente em nós dominar com o seu Cristo..." [3]
Esse reino místico de Cristo nas almas começa através da fé, que é como um grão de mostarda (cf.Mc 4, 30-32), uma semente lançada em terreno fértil (cf. Mc 4, 3-9). O anúncio do Evangelho existe justamente em função disto: suscitar a fé nas almas. Por essa virtude sobrenatural, de fato, confirma a autoridade do Doutor Angélico, "vita aeterna in nobis inchoatur – a vida eterna começa em nós" [4].
Esse reinado místico também pode crescer: (a) seja através da oração, quando, "de fé em fé" (Rm 1, 17), a alma vai progredindo na vida interior; (b) seja por meio da recepção frutuosa dos Sacramentos, mormente o da Eucaristia, pelo qual a própria humanidade de Nosso Senhor toca a nossa carne, elevando-nos à comunhão Consigo.
É para essa comunhão com Deus que a Igreja existe, a ponto de poder-se repetir, com São João Paulo II, que "a Igreja vive da Eucaristia" [5]. A Virgem Maria, os santos, os anjos, a hierarquia eclesiástica, os catecismos, tudo e todos existem em função deste fim: conduzir as pessoas à Eucaristia, à plena união com o Senhor. Só assim é possível fazer Cristo reinar nos corações, instaurando já neste mundo o Reino de Deus, até que ele realize a sua consumação no Céu.
Para que isso aconteça concretamente, todavia, não basta comungar sacramentalmente. É preciso receber Jesus também espiritualmente [6].
O primeiro requisito para comungar bem é estar em estado de graça. Quem toma o corpo e sangue do Senhor em pecado mortal não só deixa de aproveitar da recepção do sacramento, como pratica um sacrilégio. Por esse motivo, é incompreensível que algumas pessoas dentro da Igreja queirem lançar pérolas aos porcos (cf. Mt 7, 6), distribuindo a Eucaristia a quem não quer mudar de vida, como se a mera recepção desse sacramento fosse solucionar a sua situação de pecado.
Isso, porém, constitui o mínimo. Para receber com fruto Jesus na Eucaristia, é preciso, além disso,adquirir o hábito da adoração ao Santíssimo Sacramento, de modo a estar sempre "com fome" desse alimento espiritual. O jejum de uma hora que a Igreja pede a quem for comungar é apenas um sinal externo de um outro jejum, interior, indicando que ninguém deve aproximar-se da Comunhão sem uma verdadeira fome de Cristo e de que Ele transforme a sua alma.
Como dizem os Santos Padres, ao contrário do alimento comum, que é transformado em quem dele come, é este alimento que transforma quem dele se alimenta [7]. Quem comunga, portanto, deve ir para o Getsêmani e repetir com o Senhor: "Não seja feita a minha vontade, mas a tua!" (Lc22, 42). Agindo assim, querendo o que Deus quer e adorando a Sua vontade, Cristo começará a reinar efetivamente em nossas almas.

Referências

  1. Cf. BENTO XVI, Papa. Jesus de Nazaré: do batismo no Jordão à transfiguração (trad. de José Jacinto Ferreira de Farias). São Paulo: Editora Planeta do Brasil, 2007, p. 59-60.
  2. Comentário ao Evangelho de S. Mateus, XIV, 7 (PG 13, 1197).
  3. Orígenes, Sobre a Oração, 25 (PG 11, 495s).
  4. Suma Teológica, II-II, q. 4, a. 1.
  5. Carta Encíclica Ecclesia de Eucharistia (17 de abril de 2003), n. 1.
  6. Cf. Suma Teológica, III, q. 80, a. 1.

  1. Cf., v.g., Santo Agostinho, Confissões, VII, 10 (PL 32, 742).

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Homilia Diária.66: Segunda-feira da 33.ª Semana Comum (I) - O cego Bartimeu

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc
 18, 35-43)
Naquele tempo, quando Jesus se aproximou de Jericó, um cego estava sentado à beira do caminho, pedindo esmola. Ouvindo a multidão passar, perguntou o que estava acontecendo. Disseram-lhe: "Jesus Nazareno está passando". O cego então gritou: "Jesus, Filho de Davi, tem compaixão de mim!" As pessoas que iam na frente mandavam que ele ficasse calado. Mas ele gritava mais ainda: "Filho de Davi, tem compaixão de mim!" Jesus parou e mandou que lhe trouxessem o cego. Quando ele chegou perto, Jesus perguntou: "Que queres que eu te faça?" O cego respondeu: "Senhor, que eu veja". Jesus disse: "Vê! A tua fé te salvou". No mesmo instante, o cego começou a enxergar de novo e foi seguindo Jesus, glorificando a Deus. Vendo isso, todo o povo deu glória a Deus.
Hoje, o Evangelho nos apresenta a cura de Bartimeu, símbolo da condição de quem vive à margem de Cristo. Cego e mendigo, Bartimeu estava "sentado à beira do caminho" e só pôde aperceber-se da chegada de Jesus por causa da grande multidão que O acompanhava. A cegueira desse pobre habitante de Jericó sinaliza a nossa falta de fé, isto é, a incapacidade de enxergarmos a realidade à sombra luminosa de Deus, que nos revela o sentido e o valor verdadeiro das coisas do mundo; o Senhor nos desperta, por meio do dom da fé, para as riquezas espirituais que nos estão reservadas no Céu. Esta cegueira, como de resto não poderia deixar de ser, nos conduz à mendicância, quer dizer, ao estado deplorável em que, rejeitando aquela alegria eterna e perfeita que Deus deseja compartilhar conosco, nos apegamos às "esmolas" desta vida passageira: preferimos as migalhas e o pó aos bens celestes, à felicidade interminável dos filhos do Altíssimo.
Cegos e mendigos, também nós buscamos aqui na terra uma felicidade que nunca se encontra. O Senhor, porém, vem ao nosso encontro, assim como cruzara o caminho daquele cego miserável. Temos de fazer como Bartimeu: gritar e pedir a Deus incessantemente que Ele nos dê a virtude da fé: "Senhor, que eu veja!" Precisamos, pois, jogar fora os nosso trapos e mantos de mendigo, temos de nos desapegar das vaidades e das solicitações mesquinhas do mundo. Se queremos a abundância dos tesouros de Deus, devemos nos espelhar no exemplo deste cego curado: largar tudo, dar glória ao Senhor e, tomando as cruzes de cada dia, segui-lO nesta íngreme subida que existe entre a nossa vida terrena, a nossa Jericó, e a Jerusalém celeste, onde Cristo vive e reina pelos séculos dos séculos.